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Josée: dans un mois, dans un an

Josée é como areia movediça.

O filme começa com uma mulher caída na rua, ao lado de sua cadeira de rodas. Ela permanece sem nome durante boa parte do longa, até que ela se apresenta como Josée (Han Jimin)... até descobrirmos que este não é seu nome verdadeiro e que, este, nunca saberemos. Voltando à cena inicial. Um jovem estudante de engenharia, Lee Youngseok (Nam Joohyuk), a socorre e a ajuda a voltar para casa, já que uma das rodas da cadeira está quebrada. Em troca, a avó de Josée, uma coletora de recicláveis, manda que ela lhe ofereça uma refeição como pagamento. E assim, entre visitas inesperadas e pratos de comida, a distância entre eles, pouco a pouco, é diminuída.


Josée (2020) é um filme escuro, sem muitos diálogos e nenhuma ação. Os dias começam e terminam e nós, tal qual a protagonista observando a rua pelo buraco na parede do muro, assistimos às vidas deles sob a perspectiva que o nosso narrador observador decide evidenciar: e eu acho que este é um dos pontos mais especiais do filme, porque vai definir quem continuará acompanhando a história, já que a conexão com as personagens não será imediata (talvez, nem aconteça).


Josée é bastante comovente, mas não te faz chorar (exceto se você acompanhar a trilha durante os créditos, porque Lullaby da IU começa a tocar e tudo o que você estava sentindo, finalmente, vem à tona). Penso que este filme, um slice of life, te leva a pensar sobre os sentimentos que você conhece dentro das situações que você empresta dos protagonistas, algo como compreensão, sabe? Porque, o tempo inteiro, nós não experenciamos como eles sentem, sim, como eles expressam o que estão sentindo. Sozinhos, Josée e Youngseok não são os mesmos quando estão juntos. E é aí que a mágica acontece. Porque são dois universos completamente distintos tentando construir um mundinho particular entre as marcas do desamparo e da solidão que, felizmente, florescem com autoafirmação e independência (seja ela física ou emocional).


Um dos títulos do filme é "Josée, o Tigre e o Peixe" e eu amo que depois que o filme acaba, a gente consegue entender o motivo: ele é o tigre, feito para correr pelo mundo selvagem e encontrar seu lugar; ela o peixe nadando em seu próprio ritmo, quem desejava permanecer dentro do aquário. Eram as pessoas certas, no momento oportuno; necessário. E eu volto a pensar na cena da neve, quando ela tem coragem para pedir para que ele fique. Quando ele tem coragem para abrir o coração. E, pra mim, o amor deles não é daqueles que cresce em uníssono, mas que permanece intacto; congelado no tempo e espaço. Este é um filme real demais e, talvez por isso, eu tenha sentido demais. Porque, ali, eu me vi um pouquinho nos detalhes e nas entrelinhas. Me foi espelho; abraço. Ambos seguiram em frente, em seus próprios ritmos, com suas próprias cores. E o mais bonito é que, seguindo sozinhos, eles continuavam levando muito do outro em cada passo... todos os dias.

Enquanto pessoa em cadeira de rodas, preciso dizer que enxerguei muito dos meus medos em Josée. Doeu na maior parte do tempo, mas me abraçou o tempo inteiro. Todas as mentiras contadas por ela tinham não apesar a leveza da inocência que não faz mal a ninguém, mas carregavam, principalmente, a vontade de viver a vida. Do jeitinho dela. Com o protagonismo e a narrativa que ela escolheu, já que a vida lhe tirara tanto desde o nascimento... Assim, ela fazia pontes para o imaginário e o real (e o filme inteiro costura linhas entre a imaginação e a realidade). Assim, ela construía pontes sobre o mar de solidão. Assim, ela germinava nos campos abertos à visitação, fincava suas raízes no instante-já; florescia.


E aqui eu quero pedir licença para dizer que muito me agradou a forma escolhida para abordar alguns aspectos de vida de uma mulher com deficiência: não existiu jornada do herói nem foco em reabilitação. Foi retratada uma mulher complexa em suas emoções e sentimentos. E até mesmo a forma de retratar como a sociedade se comporta junto a uma PCD, seja com vocativo pejorativos, superproteção familiar, intervenções de terceiros, por exemplo, nada disso se sobressaiu a ponto de se destacar na trama porque, como é na vida da gente, essas são apenas algumas vírgulas nos capítulos das nossas histórias.


Também, não posso deixar de fazer uma costura com a obra de Françoise Sagan, "Dans un mois, Dans un an" (Dentro de um mês, dentro de um ano), já que o filme deixa claro que a nossa protagonista escolheu se chamar Josée após ler este livro. A narrativa da autora poderia ser comparada com a do filme: de uma simplicidade poética ímpar ao retratar os vazios existenciais e a efemeridade das relações. "Ouça minhas palavras doces, carregadas da amargura que a experiência traz," diz um excerto. A autora conta a história de vários amores, entre eles o de Josée, evidenciando as cicatrizes ainda abertas (ou as feridas em carne viva?) de amores que não se acabam, apenas se transformam em novos sentimentos dentre de um mês, dentro de um ano.

Josée é lento, feito de sutilezas e sensações (as expressões dos olhos do Joohyuk... meu Deus!) e com bastante profundidade. Pra mim, é meio areia movediça: ele vai te envolvendo pouco a pouco, você vai mergulhando pouco a pouco. E, quando percebe, está completamente imerso porque nada ali é pouco. É um pedacinho de vida real, essa mesma que vivemos todos os dias, sem grandes acontecimentos, mas repleta de pedacinhos de momentos aos quais chamamos de 'dia'. É sobre ter coragem pra começar, prosseguir, encerrar e recomeçar. É sobre estar disposto a caminhar na linha tênue que separa imaginação e realidade; sobre ter coragem para se questionar sobre o que é real.

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