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  • neereis

Minhas Notas Sobre My Liberation Notes


Créditos da imagem: tt @youthfmay | ig @dapithaponn
Algo bom vai acontecer com você hoje.

Com uma premissa simples e um ritmo lento e linear, My Liberation Notes (Meu Diário Para a Liberdade) tinha tudo para ser cansativo. Só que não. Cuidadosamente construído e amarrado em seus detalhes e proposta, o drama é um exemplo perfeito sobre como é possível contar uma história simples (sem cliffhanger ou trocentas reviravoltas) de forma excelente. Quando você percebe, a história te atinge em pontos sensíveis tal qual um rolo compressor, e ao mesmo tempo em que machuca, cura.


O drama conta a história de uma família que mora em Sanpo, região rural nos arredores de Seul, acompanhando GiJeong (Lee El), ChangHee (Lee Minki) e MiJeong (Kim JiWon) em suas rotinas diárias entre casa-caminhada-ônibus-trem-trabalho-trem-ônibus-caminhada e a repetição da mesma rotina de novo e de novo e de novo; além da convivência com o novo vizinho, o calado Gu (Son Sukku), quem também é funcionário da fábrica de pias do pai do trio de irmãos. Minki comentou numa entrevista que o drama é quase um documentário e eu penso o mesmo. A repetição das rotinas nos leva para aquela região, nos faz sentir como se estivéssemos vivendo com eles as exaustões, as dificuldades e as necessidades; mas também nos faz sonhar juntos.


E esse é um dos pontos altos do drama. O desenvolvimento das personagens é incrível, seja individual, seja coletivamente. Não há negligência a nenhum deles, por menor que seja o tempo de tela, o roteiro abraça as dores e ambições de todas as personagens de forma tão crua e honesta, que por vezes o sentimento é agridoce: nós vamos vivendo junto com eles, nessa rotina dolorosa de almejar o que se precisa e tentar conseguir o que se quer, confirmando, por vezes, que a maior habilidade do ser humano é, simplesmente, existir. Nas linhas do Park HaeYoung percebemos que todos precisamos de libertação, que é possível encontrar pílulas de felicidade em meio à inércia dos dias porque, se tivermos sorte, "algo bom acontecerá conosco hoje."


Créditos: tt @Sequence925


  • Minhas notas sobre o senso de realidade

Os questionamentos internos da maioria das pessoas (eu, inclusive!) estão impressos na tela de maneira bastante realista. A solidão que sinto sempre que pensamentos sobre futuro surgem; o vazio e a introspecção; os medos naturais à juventude e à velhice; as necessidades de amar e ser amado; as relações de hierarquia, a competição e os abusos no ambiente de trabalho; as agonias sobre não estar progredindo enquanto todo mundo parece estar "realizando algo, conquistando algo"... sentimentos dos habitantes de Sanpo, de Seul, do interior do Brasil.


Cada personagem é demonstrada em luz e sombra, tal qual somos. As escalas de cinza justificam os comportamentos e as ações, não necessitando de maiores explicações porque a gente entende. E por que a gente entende? Porque sente como eles. E não existe resposta certa nesse quesito porque viver não é prova objetiva.


  • Minhas notas sobre a adoração

Eu não sou bom em adoração agora?

MiJeong queria sentir-se inteira, digna de amor, e pediu ao estranho da porta ao lado para adorá-la (DJ, toca False God da Taylor Swift, por favor!); questionando se ele também gostaria de ser adorado. "Como se adora alguém?," ele perguntou. "Você torce por essa pessoa. Você diz que ela pode fazer qualquer coisa porque tudo é possível," ela respondeu. E isso me fez pensar em como é mais fácil verbalizar coisas muito íntimas para pessoas que, inicialmente, são completamente estranhas. Em como nossos vazios e anseios, tão profundos, tão humanos, quase nunca são verbalizados por medo de como vamos nos sentir, de como o outro vai receber nosso sentir porque, infelizmente, passamos pela vida sentindo esse tipo de sensação e desejando ser preenchido já que não há nada mais triste que uma árvore que não floresce nunca.


E convite à adoração é um convite à mudança da chavinha entre definhar até morrer ou regar até nascer. E quase ninguém está disposto a semear as próprias sementes, que dirá a do outro. Porque exige tempo, cuidado, desprendimento e conexão. Assim as relações são nutridas. Assim a intimidade é fortalecida.


Às vezes, acho que as pessoas danificadas são muito mais honestas do que aquelas que vivem suas vidas felizes.

  • Minhas notas sobre o amor

A relação de MiJeong e Gu, tão incomum, mas tão bonita, me fez repensar várias coisas. A Katy Perry, numa das minhas músicas preferidas de seu repertório, canta a descoberta do amor pelos sinais: "Se as estrelas não se alinharem / Se isso não fizer o tempo parar / Se você não puder ver o sinal, espere por ele / Cem por cento / Com cada centavo gasto / Ele será o cara que terminará suas frases / Se não é como nos filmes / É assim que deveria ser, sim / Quando ele for o cara certo, eu vou me despir / E o meu mundo vai parar de girar". E quando aquele querido amigo do ChangHee (interpretado pelo Han SangJo) fala que sempre que vê a mulher que gosta, seu coração acelera, ele confirma a teoria universal de que o amor caminha de mãos dadas com as "borboletas no estômago."


Maroon 5, por sua vez, afirma que o amor "nem sempre são arco-íris e borboletas / É um compromisso que nos ajuda a continuar" e isso me faz pensar no casal principal de My Liberation Notes. Porque a MiJeong é rápida ao retrucar que o coração dela acelera apenas quando algo ruim pode acontecer porque, quando ela ama alguém, o coração bate ainda mais devagar, entra em estado de paz como se estivesse se libertando de algo. Pelo amor de Deus, eu fiquei completamente abalada!!


GiJeong, a irmã mais velha e personagem que mais falou comigo, talvez porque eu demorei a aceitar que muito dela reside em mim (acho que sem 'talvez', mas eu ainda não estou pronta pra essa conversa, rs) vive na corda-bamba do desespero. E cada mudança em seu visual é um reflexo da baixa autoestima, dos sentimentos que não expressa ou que expressa demais e mete os pés pelas mãos, dos sonhos que reprime, das pressões familiares e societárias que sente. Tudo nela é demais. Sente demais, fala demais, rápido demais. E, mais, é o que ela sempre quis. A relação que ela constrói com o TaeHoo (Lee KiWoo) imprime na tela um exemplo realista das primeiras vezes que residem nas segundas (ou terceiras!) vezes, naquele lembrete de que a vida é um conjunto de primeiras vezes mesmo que, por vezes, a gente se esqueça disso e se culpe por não ser tão confiante ou tão sábia.


Em meio a uma conversa sobre "regras de relacionamento para se estabelecer controle", ela não apenas demonstrou a insatisfação naquele joguinho de esconde-esconde em que pontua quem se fizer de mais difícil ou responder por último, como protagonizou uma das minhas cenas preferidas: "Por que é uma boa coisa deixá-lo ansioso? Você fica ansioso e isso te enlouquece. Isso não é ruim? Isso é desconfortável, não é? Quando um homem e uma mulher se gostam, eles não deveriam se dar por completo? Por que racionar em pequenas porções? Por que eu deveria dar meu afeto dessa forma? O que há de bom em não dar o suficiente? Você não deveria dar o máximo que puder?". Mulher, eu te amo!!


  • Minhas notas sobre a poética do silêncio

Sutileza talvez seja o segundo nome do drama. O elenco impecável conseguiu falar demais numa palavra, num olhar e meu destaque vai para Cheon HoJin, quem interpreta o Sr. Jeom, Son Sukku e Lee El. E aqui falarei de trás para a frente: ela teve muito texto para decorar, confesso, mas as expressões em seu rosto mudavam em fração de segundos, como se estivéssemos em frente a uma vitrine de emoções. Radiante, desesperada, feliz, desolada, envergonhada, devastada, humilhada, desajeitada; ela é incrível! Son Sukku telegrafava sentimentos à medida que a câmera focalizava em seu rosto: seja olhando para o vasto e impreciso horizonte, seja devolvendo gentileza para a família que o abraçou sem fazer perguntas. Já o Cheon HoJin, que espetáculo de atuação! O sisudo e silencioso patriarca da família falava com o corpo, tecia frases inteiras em linhas invisíveis de silêncios e me fez chorar muito na reta final do drama, eternizando algumas cenas em minha mente tamanha capacidade de imprimir sentimento.

Além da atuação brilhante (do trio, do elenco), a trilha sonora de My Liberation Notes também é protagonista. Nos momentos de silêncio contemplativo, era a música de fundo quem contava a história ao preencher as lacunas dos diálogos com emoção. E por falar em emoção, o episódio final. Não darei spoiler, claro, portanto, me apegarei a uma ilustração. A moeda de 500₩ tem valor pequeno, mas ainda assim é importante, principalmente se junta a outras moedas. E o fato de cair, mas ficar equilibrada, é um convite para um novo olhar: tudo pode ir pelo ralo; tudo pode começar novamente. "Algo bom vai acontecer com você hoje," o lembrete diário. E não há nada mais libertador que perceber a mudança borbulhando de dentro para fora. Mudanças que acontecem em silêncio, que não surgem com fórmulas mágicas nem de um dia para outro. Foi preciso a passagem de tempo para demonstrar que os dias não são iguais, apesar de parecerem todos iguais porque os dias mudaram, ainda que não drasticamente, ainda que nem toda mudança tenha sido positiva porque, no fim do dia, percebemos que toda mudança é necessária.


  • Minhas notas sobre as relações familiares

“Você ainda tem nós três ao seu lado, pai," relembrar essa cena me emociona porque o laço familiar foi fortalecido à medida que os capítulos passavam, à medida que os Yeom necessitavam uns dos outros. Eu amei a forma de ilustrar dois trios de irmãos completamente distintos, seja uns dos outros dentro das próprias tríades, seja na forma como a 'pequena família' de três irmãos se descortinava.


"Quando for a hora certa, você deve conhecer seu parceiro de vida, se casar, ter filhos e vê-los crescer. Como é que tantas crianças hoje em dia se recusam a fazer isso e envelhecem sozinhas? (...) Experimente ter um filho. Você vai se sentir cheio sem ao menos ter comido. Todos os dias serão incríveis. Você será invencível," o discurso da Sra. Yeom (Lee KyungSung) expõe o pensamento dos mais velhos sobre o que é ter sucesso. Constituir família e sair da casa dos pais é o curso natural da vida, para uns, é uma pressão societária que precisa ser revista, para outros. "Mãe, depois que você nos teve, você desfrutou apenas de dois ou três anos de alegria e prazer, então sua vida ficou miserável. Você realmente quer passar esse tipo de vida para nós? E se quisermos nos sentir alegres o tempo todo, devemos continuar tendo filhos até os 80 anos? Até nós morrermos?," ChangHee, devolve à mãe algo que me deixou pensando por bastante tempo, principalmente porque vimos uma matriarca que negligenciou quem era para assumir o papel de mãe e esposa, de cola que mantém todos unidos debaixo do mesmo teto, fazendo da casa seu universo particular de cansaço e tristeza, como tantas mulheres ao redor do mundo; uma pena.


Eu amo como os dramas coreanos, principalmente, abordam questões tão simples, tão importantes, de forma natural. Gosto da forma de gerar reflexão a partir de uma cena cotidiana em que pratos são lavados ou a mesa é posta. Gosto como as famílias estão reunidas à mesa, dividindo momentos ainda que o único som seja do tilintar dos talheres na louça.


Eu não existia antes de 1991 e não existirei em 50 anos, mas sinto que existia antes disso e ainda existirei depois disso.

  • Minhas notas sobre os reflexos e os espelhos

Uma coisa que amo nas cenas de My Liberation Notes é a forma de mostrar as personagens através de seus reflexos nos vidros dos ambientes, como se a eles fosse dada a liberdade de se assistir existindo. Isso me faz lembrar da MiJeong espumando de raiva na casa do Gu quem, ao invés de ir pelo caminho natural de a) questionar a pessoa; b) apontar soluções; c) indignar-se junto; começa a cozinhar para ela. Enquanto ela come e ele a assiste, suas feições colorem o vidro que os separa, emprestam ternura ao momento de compreensão mútua em que sentimentos são acolhidos e respeitados.

E quando penso em reflexo, penso em espelho. E penso que Gu e MiJeong funcionam tão bem juntos porque não exigem aquilo que o outro não pode (ou não consegue) dar. E preciso dizer que esse foi o retrato mais fiel de um introvertido que eu já vi na ficção. Enquanto ChangHee e GiJeong transformam em (muitas!) palavras o que sentem, a caçula vaga pelos dias com a sensação de estar presa, sufocada; com a certeza de que precisa criar narrativas mentais para aguentar mais um dia e mais um e mais outro. “Não vou fingir que estou feliz. Não vou fingir ser infeliz. Eu serei honesta," admite para si mesma enquanto mistura teimosia com coragem até decidir que quando a primavera chegar, ela será uma pessoa diferente. E por enxergar em Gu alguém que também precisa ver além daquilo que os olhos enxergam, convida-o para, de mãos dadas, aventurarem-se nesse labirinto de espelhos.


  • Minhas notas sobre os vazios

“Não estou infeliz, mas também não estou feliz. (...) Estou exausta. Não sei quando tudo começou a dar errado, mas estou exausta.” Os sentimentos de MiJeong me convidaram para refletir. Apesar de, à primeira vista, parecer que ela está apenas passando pela vida, a trama nos revela que os vazios dela respondem pelo nome de definhamento, palavra utilizada para descrever o mal-estar que acometeu milhares de pessoas durante a pandemia, por exemplo, que pode ser explicada como "ausência de bem-estar (...) um desespero silencioso".

"Então, por que continuo olhando para o meu relógio? Acho que sinto uma compulsão por viver um dia produtivo (...). Estou constantemente olhando para o meu relógio e sendo perseguida pelo tempo.” A sensação de não ter tempo, de estar perdendo tempo, de não saber aproveitar o tempo que se tem, como se os momentos felizes não fossem suficientes para trazer satisfação, mas os tristes não fossem tão extensos para causar insatisfação. E por perceber estar à beira de, ela buscou libertação. Sem saber do quê, sem saber por que... penso que saber o que não se quer é tão (ou mais!) importante do que saber o que se deseja e a jornada da protagonista a partir do Clube de Libertação, evidencia que sempre dá para recomeçar.


  • Minhas notas sobre as notas de libertação

Você tem certeza de que você e eu seremos diferentes quando a primavera chegar?

Quero tomar o caminho inverso e comentar sobre a libertação que acontecia à medida que o Clube de Libertação existia. A relação de Gu com a bebida funcionava como uma anestesia às culpas que ele carregava; era como tomar um gole de morte diariamente até que, lentamente, ela viesse lhe recolher. E sentir culpa, no caso dele, era o que lhe fazia viver, porque o deixava no controle da punição diária que imputava a si mesmo; quase como um ritual (a genialidade do texto ao linkar esse aspecto com os rituais de adoração). E o verde, sempre atrelado à esperança, é transformado na prova do seu fracasso, da sua vergonha. Até conhecer MiJeong e o convite para serem diferentes quando a primavera chegasse. MiJeong o presenteou com aquilo que ele mais precisava: um propósito. E, se tem algo que aprendi com meu pastor, é que a gente só deve dar acesso a quem nos dá propósito; destino.


Com a conexão, os pequenos gestos iam, paulatinamente, cortando o ritmo ditado pelo álcool: alguém para comer e beber junto, para fazer o caminho de volta para casa, para enviar uma mensagem, para pensar enquanto olhasse para a beleza da natureza. Mas a cura não é linear, todos sabemos. E ele cai. E se levanta. E cai de novo. Mas a conexão deles é como o fio invisível (do amor? sempre ele!) que controla os altos e baixos da montanha-russa da vida. As notas de libertação são simbólicas, exigem que estejamos dispostos a morrer para nascer de novo e, no fim, percebemos que a libertação de ambos estava apenas começando. Porque, no fim, eles estavam libertos das amarras que os impediam de se sentir inteiros.


Quero ver o céu enquanto estou vivo.
 

My Liberation Notes está entre as melhores coisas que já assisti. Mas penso que não é para todo mundo porque depende muito da conexão de quem assiste com a história que está sendo assistida. É preciso estar disposto a se relacionar com as circunstâncias demonstradas e se conectar com as personagens; é preciso estar disposto a acessar as próprias emoções. Se você está disposto a isso, bem-vindo ao Clube da Liberação! Os 16 episódios de My Liberation Notes (Meu Diário Para a Liberdade) estão disponíveis na Netflix.

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