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Crash Course in Romance: o amor não é proibido para maiores

Crash Course in Romance (Intensivão do Amor, Netflix), está sendo rechaçado/boicotado em seu país de origem por conta dos protagonistas: primeiro, alegaram falta de química entre Jung Kyungho e Jeon Doyeon por conta da diferença de idade entre eles (ele tem 39 anos; ela, 50), o que já expeliu notas de preconceito escancarado em diversos níveis. Depois, começaram a atacar a trama: por que Choi Chiyeol, um homem que tem tudo e, consequentemente, pode ficar com qualquer pessoa, escolheria Nam Haengsun como a fonte de sua afeição e sentimentos? Logo ela, uma mulher na faixa dos 40 anos, que administra um restaurante de acompanhamentos e se veste de forma confortável ~simplória~ demais? Ela, quem confunde algumas palavras e, pior, nunca esteve num relacionamento anteriormente? Ela, intrometida por natureza e que fala alto sem perceber?



Parei para pensar: essa é a primeira vez que vemos coreanos sendo preconceituosos por este motivo? Infelizmente, não. Romance is a Bonus Book, também disponível na Netflix, sofreu o mesmo tipo de boicote. The Glory (A Lição, Netflix) e Encounter (Viki), protagonizados pela maravilhosa Song Hyekyo, são constantemente citados da mesma forma porque a protagonista tem 41 anos e os respectivos pares românticos, 27 e 29 anos. Lost, também estrelado pela Jeon Doyeon, foi massacrado porque havia uma diferença de idade de 15 anos entre os protagonistas. Não são apenas coincidências. Assistir a um relacionamento amoroso (ou a possibilidade de um!) envolvendo uma mulher mais velha parece incomodar e nós sabemos o nome disso.


As formas de envelhecer uma mulher na ficção seguem, quase sempre, um mesmo caminho: de interesse romântico a alívio cômico a mãe dos protagonistas sem direito a plots românticos. E se a 'arte imita a vida', abrir um campo de discussão para o debate, a partir da ficção, é extremamente necessário. Porque dramas, séries e novelas contribuem para que o grande público converse e perceba temas que, por muito tempo, foram/são considerados tabu. E que delícia é ver atores mais velhos interpretando personagens que superam o senso comum! Um exemplo? Em Belíssima, telenovela de Sílvio de Abreu, a personagem da Fernanda Montenegro, a septuagenária Bia Falcão, era sexualmente ativa; um passo superimportante para desmistificar a feminização da velhice porque, graças a Deus, estamos contemplando, cada vez mais, a longevidade das mulheres.


A juventude ainda soa como um valor muito necessário, talvez, principal. Rugas? Cabelos brancos? Marcas do tempo? Vilões a serem combatidos, sinais que não devem transparecer. "Olhem a Alessandra Negrini, nem parece ter a idade que tem, tá ótima! A Glória Maria estava novíssima! Gente, a Jennifer Lopez continua deslumbrante! E a Halle Berry? É impressionante o quanto ela se mantém jovem..." E as matérias ganham títulos como "Elas pararam no tempo: veja 10 mulheres que não aparentam a idade que têm!"; "No formol? Adivinhe a idade dessas 5 celebridades, você vai se surpreender...". Acaso é pecado a pessoa continuar viva e ATIVA por tempo demais?


Como percebemos, o etarismo não atinge apenas mulheres idosas. A sociedade ainda não lida bem com o envelhecimento feminino. O 'autocuidado' por muitas vezes é fruto de uma cultura antienvelhecimento. São procedimentos estéticos absurdos que prometem juventude eterna... até que você não pareça tão jovem assim. E é um sistema tão cruel que chama homens de cabelo branco de "grisalhos" (quase sempre seguidos da palavra "charmosos") enquanto os fios brancos das mulheres são adjetivados como "feios", "cabelo de bruxa" etc. porque à mulher, envelhecer, é crime. E merece punição. Homens mais velhos com mulheres jovens? "Nossa, que interesseira!" Mulheres mais velhas com homens jovens? "Crucifiquem-nas!". Nada, nunca, está bom... exceto se você for homem. Mas esta é outra história. O que me trouxe aqui é a revolta por conta do que a Coreia tem feito ao meu conforto semanal.



"Jeon Doyeon parece uma tia perto do Jung Kyungho (...) ou dona de uma pensão com seu inquilino mais jovem", disse uma conta. “Nem me preocupei em assistir ao drama porque os dois não tinham química física,” outro comentário extraído sobre o drama. Não interessa o roteiro. Não interessa o talento dos atores. Não interessa o quanto a história é bem executada ou a construção maravilhosa do romance: eles apenas veem um número. E, falando em número, eu quero dizer que este drama é 1 em meu coração. Porque não imaginei estar tão investida na história de um professor de matemática cheio de traumas e de uma ex-atleta de handball, cozinheira e mãe solo de uma jovem que se torna aluna do 'professor estrela' e, a partir daí, uma história de amor começa a ser escrita. Crash Course in Romance é aquele clássico enemies to friends to lovers que faz nosso coração disparar com as faíscas, nossa barriga doer de tanto rir com a dinâmica do casal (antes mesmo de ser um casal).


E focando na Nam Haengsun, que deleite é ver uma personagem como ela! Porque ela, em todas as suas características e detalhes, é real. E acompanhar essa mulher na faixa dos 40 anos se apaixonando pela primeira vez, é delicioso de ver. Porque eu sinto falta de ver a representação de romance maduro, com todas as questões e obrigações da vida adulta. E uma mulher virgem que assumiu o papel de mãe de sua sobrinha (mas a ama como filha biológica) e, para driblar os preconceitos que uma mãe solo enfrenta, sustentou a história sobre ter um marido que trabalha fora (e nunca aparece)? Me deem histórias reais sobre pessoas reais! E se essas histórias garantirem o final feliz, melhor ainda! O sabor que está sendo acompanhar essa mulher não redescobrir, mas descobrir o amor e o quanto ela merece (e pode! e deve!!) ser amada por quem é, tem sido meu combustível para encarar mais uma semana e outra e outra.



O drama está se encaminhando para a reta final, muita coisa ainda está para acontecer e, finalmente, começamos a acompanhar de pertinho Nam Haengsun e Choi Chiyeol sendo um casal babão e apaixonado (a declaração que ele fez sobre/pra ela, o jeito que ele olha pra ela... MEU DEUS DO CÉU, É POETIC CINEMA!); mas o roteiro, a cada semana, reafirma seu desejo de apagar o 'apesar de tudo', o "vencimento" que parece rotular em corpos femininos sempre que os janeiros vêm e vão. Talvez o problema não seja chegar aos 50 protagonizando uma romcom ou passar dos 40 se permitindo se apaixonar pela primeira vez. Talvez o problema seja chegar aos 50 e continuar sendo uma atriz poderosíssima ou passar dos 40 e perceber que o amor não é proibido para maiores.

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