Moving: com grandes poderes vêm grandes histórias de amor
Você não é estranho, apenas um pouco diferente e especial.
Quando falamos sobre histórias de super-heróis, logo pensamos nos universos da DC e da Marvel, que dominam o gênero por décadas, seja em filmes ou séries derivados dos quadrinhos. E a aposta da Disney+ (no Brasil o drama fora distribuído pela Star+) foi continuar explorando o gênero, mas contando com um detalhe muito importante: a forma sul-coreana de contar histórias. Assim, nasceu Moving (Em Movimento). E, se Moving tem um superpoder, é a habilidade de dar vida a personagens com o que gosto de chamar de humanidade super.
Adaptado do webtoon de mesmo nome, Kang Full e Park Injae, contaram com um orçamento milionário e reuniram um elenco bilionário, mas não chegariam tão longe não fosse a capacidade de alcançar o coração do telespectador. E a maneira encontrada foi genial: os 07 primeiros episódios foram lançados ao mesmo tempo, garantindo uma minimaratona que deixou com gosto de quero mais. A partir daí, as quartas-feiras eram preenchidas com 02 capítulos; trazendo no final a tríade de encerramento com todos os risos, as lágrimas e as cenas pós-créditos que nos fazem esperançar uma próxima temporada!
À primeira vista você pode pensar que é apenas mais uma história de super-herói, nada de novo, mexe no controle procurando o próximo programa. E nós somos, inicialmente, apresentados aos jovens Bongseok (Lee Jungha), Heesoo (Go Younjung) e Kanghoon (Kim Dohoon), estudantes do último ano da mesma classe na Escola Jeongwon, e que têm habilidades super-humanas, mas vivem de forma discreta... até seus pais começarem a ser caçados; até que eles se tornem alvos. E é aí que a trama ganha corpo. Porque é aí que os grandes poderes dão margem às grandes histórias de amor.
E eu não vou me aprofundar sobre os efeitos especiais, as cenas de ação que dão a sensação de estarmos controlando um personagem de videogame, as sequências de tirar o fôlego ou os banhos de sangue, porque todos são impecáveis. E não posso deixar de dizer que o drama inventou um gênero próprio porque é uma história de fantasia, que também é ação, mas que é aventura, mistério, romcom, drama familiar, drama adolescente. A gente não sabe o que esperar no fim de cada capítulo, mas a gente sabe que vem algo melhor ainda em toda a costura entre passado e presente que nos proporciona a oportunidade de conhecer quem é a pessoa no papel de herói.
Porque o que Moving tem de mais especial é a forma de despertar em quem assiste, os sentimentos mais humanos que existem. A trama, pouco a pouco, apresenta as motivações das personagens, seus anseios e traumas. E sempre que somos levados ao POV da personagem de destaque, conseguimos ver em nós, um pouco deles; já que todas as personagens são altamente cativantes e identificáveis, à sua maneira. E a partir de agora esse texto pode ser acusado de trazer spoiler, de entrar na fase 'muito sentimento e pouca coerência', de se repetir gritando que Moving é das melhores coisas que existem no audiovisual. Você foi avisado ;)
As relações familiares são carregadas de uma profundidade extremamente relacionável. Na trama, vemos arranjos familiares principalmente formados por mães e pais solo, pais ausentes, pais com deficiência: é um retrato muito mais acurado das sociedades atuais porque traz a diversidade contida na atualidade. E o que todos esses adultos têm em comum, além de filhos que herdaram seus poderes especiais, é o amor incondicional: aquele que não enxerga o medo da morte porque maior que o perigo de perder a vida é a vontade de permitir que um pedaço de si mesmo, viva. E o drama retratou tudo isso sem invisibilizar as ações que, futuramente, seriam a razão dos traumas da 'geração que veio depois'.
A superproteção de uma mãe que carregou o filho nas costas durante anos para que ele não saísse flutuando por aí; a ausência de um pai que apenas fora compreendido no momento do seu funeral; a imagem inerte e abatida de um pai que vivia todos os dias como se fossem um só. Até sermos apresentados aos pontos de vista deles. Até conhecermos as histórias que os moldaram a ser quem são; como são. E não falo isso como se a trama tivesse o desejo de inocentar ações ou diminuir o impacto delas, pelo contrário, olhar pelo ponto de vista de cada protagonista nos ajuda a perceber que, apesar de serem superfortes, ou terem supersentidos, ou controlarem a eletricidade (Gyedo (Cha Taehyun) e Youngseok (Choi Deokmoon)), eles são seres humanos... tentando.
A narrativa, em momento algum, pende para um lado: não vemos pais antiquados ou julgadores nem filhos ingênuos ou irracionais. O equilíbrio das dinâmicas é completamente válido para entendermos os comportamentos de pais e filhos. As relações são complexas. Inclusive quanto ao que, à primeira vista, nos parece a representação do mal. Porque, se você terminou o drama culpando algum dos super-heróis norte-coreanos, sinto muito, mas você precisa rever alguns episódios. E este é mais um ponto para o roteiro!
No fim das contas, Norte e Sul são vítimas da ganância humana, de um sistema que sobrevive durante décadas porque faz de tudo para se proteger; para se manter vigente. É um problema moldado por inflexibilidades: as representações da "vilania" são meras fachadas porque as pessoas na representação de poder são meras peças no tabuleiro da vida. Pessoas são substituíveis, aquela ideologia, infelizmente, não. E ao assistir à sequência final, é impossível não ser invadido por compaixão. Porque, volto a repetir, eram pessoas com humanidade super.
Pessoas superpoderosas se machucavam, sangravam e morriam dos dois lados. A lágrima era a mesma porque a dor era a mesma. Os traumas de um passado trágico, de um presente sombrio, de um futuro incerto, estavam lá. E não há cena mais emblemática que nossa querida Heesoo consolando o "gigante" norte-coreano (Park Gwangjae) molhado de sangue e lágrimas, no meio da rua, porque tudo o que ela poderia oferecer era carinho. Sem saber, aquilo era tudo o que ele precisava, porque ela o enxergou como gente, não como arma.
Com o avanço da história, somos cativados pelas histórias de amor. Todas elas. Eu vi a Mihyun (Han Hyojoo) dedicar uma vida inteira para proteger o próprio filho de reviver os dolorosos passos do pai; uma mulher de aparência taciturna, mas que diariamente ensinava ao filho que a "empatia era o maior poder que ele tinha". Eu vi o claustrofóbico Joowoon (Ryu Seungryong) encarar um emprego numa mina de carvão porque precisava dar estabilidade à filha pequena, após a morte da matriarca da família. Eu vi o Jaeman (Kim Sungkyun) viver uma rotina que parecia ditada pelo relógio, mas que era programada em função às necessidades do filho, porque a maior alegria dele era ser pai. Foram cenários de dor pintados com a cor da esperança. Foi a certeza de que "pessoas normais" podem se tornar heróis.
Porque o Ilhwan (Kim Heewon), agente/professor de educação física, foi um verdadeiro pai para os jovens daquela escola e arriscou a própria vida para proteger os dados de pessoas inocentes; para que outros inocentes não se tornassem efeito colateral de uma guerra anunciada. Porque a senhorinha do açougue (Hwang Jung Min) salvou a vida da Mihyun quando se encontraram pela primeira vez e, dali, uma parceria quase sem tempo de tela, foi forjada nas conversas silenciosas que apenas mães são capazes de traçar. Porque a Jihee (Kwak Sunyoung) salvou a vida do nosso querido Joowoon por diversas vezes com o poder do sorriso, da gentileza, do amor. E por falar em amor, como todas as relações românticas foram bem representadas e trabalhadas!
Temos a adorável relação do primeiro amor entre Bongseok e Heesoo, marcada por flutuações, PI e jaquetas amarelas. Repararam na cor? O amarelo representa o amor eterno, como a gente costuma ver nos guarda-chuvas em vários dramas (para saber mais, confere essa postagem aqui), e eu amei a releitura do guarda-chuva para um casaco/ capa de chuva com capuz e amei mais ainda saber que, no final da história, ele estava usando o casaco dela, me comprovando que era apenas o comecinho da relação a dois. Voltando no tempo, podemos acompanhar os relacionamentos dos pais de ambos, quando ainda eram solteiros, na descoberta dos sentimentos, na certeza do sentir. Entre xícaras de café, livros sobre luta, costelas de porco e cortinas/tetos de cor roxa, nosso coração acelerava sempre e todas as vezes em que eles, literalmente, roubavam a cena (os zoinho do Dooshik (Zo Insung) moram de graça na minha mente!): os aspectos mais "humanos" de Moving são tão hipnotizantes que, por vezes, me faziam esquecer de que estava assistindo a um drama sobre super-humanos.
Não posso deixar de falar sobre o casamento do Jaeman com a Yoonyoung (Park Bokyung), porque quanta parceria! Enquanto pessoa com deficiência, reconhecer os olhares que ele recebe, foi um ponto que me fez relacionar com ele automaticamente, porque apesar de nossas deficiências serem distintas, o capacitismo é o mesmo. Eu gostei que o drama não suavizou as formas que os outros o viam, infelizmente algo ainda vigente (e completamente inaceitável, aliás), mas amei que o retrataram como parceiro provedor do lar e chefe de família em todo o momento. Ele era um homem com deficiência que também era esposo, pai e super-herói e eu amei cada segundo disso!
Não faltam motivos para suspirar, acelerar o coração se apaixonar por Moving. Mas também não faltam razões para ficarmos nervosos, apreensivos. para chorar. Entre governos, agentes secretos e assassinatos, preciso fazer um parágrafo sobre o Frank (Ryoo Seungbum), um assassino da CIA cuja missão é eliminar a primeira geração de super-heróis sul-coreanos. Saber que ele é criação de um projeto de massa que explora crianças e as expõe a condições sub-humanas, machuca. Porque "brinca" com todo o jogo de palavras que o drama traz desde o começo: são super-humanos, mas a ele fora negada a parte da humanidade desde muito cedo, infelizmente.
Moving é, sem dúvidas, um dos melhores dramas do ano. Com uma trama incrível, plots surpreendentes, elenco estelar e personagens cativantes, histórias de amor são contadas ao longo de 20 episódios.
Tem final feliz?
Tem.
Vanessa, vc está me fazendo ter olhos úmidos...! Muito obrigada por esse presente! Tá tão perfeito quanto Moving.